Outro dia, o Seth Kugel (aka Frugal Traveler) publicou um post no NYT falando como tinha sido em parte bem esquisito voltar pra casa depois de 11 semanas rodando o Mediterrâneo. Li o post quando eu estava prestes a voltar pra casa depois das férias na Espanha (férias com vírgula, bien compris, porque eu ia todas as manhãs para a bilioteca trabalhar para subir posts, entregar colunas semanais etc) e estava mesmo pensando sobre isso, em como a noção de casa ficou esquisita pra mim.
Venho pensando nisso desde maio, na verdade, quando em Bilbao uma alemã que eu acabava de conhecer, ao invés de me perguntar “de onde você é” ela poeticamente me perguntou “que lugar no mundo você chama de casa?”. Demorei uns bons segundos a mais pra responder.
Que o mundo do travel writing é uma delícia, isso é claro; eu amo o que faço e não saberia fazer outra coisa da vida (acho). Mas essa vida de ir e vir não tem, nem de longe, todo o glamour que as pessoas creditam a isso. Ninguém pensa no sem fim de horas perdidas em aeroportos e voos, no sono nunca em dia, nos pés constantemente (muito) inchados, no ganho de peso inevitável pra maioria, na mudança maluca de fusos o tempo inteiro, na saudade, nos relacionamentos complicados, na grana suuuuuper variável (e volátil) mês a mês – pra dizer o mínimo. Trocar a noite pelo dia e ficar meio desorientada já não é mais um fenômeno esporádico, que acontece no comecinho da viagem – virou meio rotina, com tão frequentes mudanças de fuso. E a insônia também virou companheirona, infelizmente.
“Waiting areas have become my living room”, diz o Seth no post. A verdade é que, ultimamente, quando eu pouso em Guarulhos, eu já nem sei mais se estou “chegando” ou se vim “passar uns dias”, já que vira e mexe tenho outra viagem em seguida :-)))) Há anos não tenho mais férias; em toda e qualquer viagem meu caderninho está em ação anotando nomes de lugares, preços de cardápios, horários de museus e outros do gênero. A viagem sempre tem momentos em que eu fico tipo um zumbi procurando wifi pra entregar os deadlines da semana. E não sei mais se minha casa é “casa” mesmo, no sentido ET-phone-home da coisa. Dormir na minha cama já não é mais tão legal quanto antes nem tem aquele sentido de “minha cama” que tinha (embora, que Dorothy não me leia, eu nunca tenha sido do tipo que tem saudades da cama e do travesseiro nas férias nem nunca achei que there is no place like home).
Tenho passado em média uma semana ao mês em casa – digamos de 25 a 30% do ano, quando muito. E olha que uma mulher zanzando sempre por aí significa ter que pensar além de malas, condomínio, contas, faturas etc, em manter a depilação, o cabelo e as unhas em dia, no mínimo (com direito a TPM e tudo). Afinal, “hit the road” não significa relaxo pessoal pra turma dos #brioches ;-)))))
Recebo religiosamente toda semana pelo menos um mail de alguém me pedindo dicas e conselhos pra se especializar e trabalhar com jornalismo de viagem. Em geral, gente diz que acha “o máximo” a vida que levo e “sonha” em viver de viajar e escrever também. Se você, que lê esse postzinho bem pessoal agora, também é dessa turma que anda pensando seriamente em entrar pra esse mercado (já BEM inflacionado de gente, vale dizer), encerro com o que eu sempre respondo a quem me manda esses mails: não tem todo esse glamour e romantismo que você pensa, não; tem que ser uma escolha bem consciente. Toda profissão tem coisas boas e ruins, tem perdas e ganhos, e tudo na vida é uma questão de prioridades. Mas é apaixonante. Mesmo.
Por isso mesmo mal voltei das minhas férias à espanhola e tô embarcando de novo hoje assim cedinho. Aguardem. Tem muito Chile pela frente 😉
entre as vantagens vc esqueceu de citar um ponto mto importante: seu trabalho cria sonhos em muitas gente. Dream maker total! Privilégio de poucos Beatles, J K ROwling, marvel, Mari Campos. 🙂
Boa viagem!
ai, Tati, ti cosa linda!!! <3 <3 <3
Adorei Mari! É isso mesmo. As pessoas só enxergam o lado “glamouroso” da coisa. Não deve ser nada fácil ficar longe de pessoas queridas por muito tempo.
Quando eu morei na França, vi minha sobrinha começar a andar pelo Skype. Aquilo me cortou o coração e eu não conseguia parar de chorar. Não é fácil, mesmo!
Viajar as vezes cansa tanto que é preciso tirar férias das férias, não é? (pelo menos para mim desde que comecei a viajar com criança, rs). Por isso imagino mesmo o quão pesado pode ser, e o quão apaixonante que é! Penso que para quem uma vez entrou nessa profissão, seja difícil querer mudar suas prioridades.
Sem dúvidas deve ser complicado e cansativo… Passei 13 dias na Europa e voltei exausta, imagino como seja para você.
Como sou autônoma, a parte da grana super instável e volátil eu entendo perfeitamente! =p
E sabe que nunca fui de sentir falta de dormir na “minha cama” também? Principalmente se estiver com uma cama confortável! =)
Mas ver o resultado do trabalho, com as viagens que você nos proporciona através das suas palavras e dicas, também deve ser super gratificante né?
Ótimo texto Mari! Sempre há os dois lados da moeda… Maso importante é que você adora o que faz! Parabéns 🙂
Mari, querida, não poderia concordar mais com você! Olha, amiga, TE ENTENDO, VIU? É engraçado, às vezes, quando eu volto de uma viagem, todo mundo sempre me pergunta: “e aí, foi uma delícia?” e eu me pego respondendo: “ah, Roma é linda, mas o hotel era uma droga, tô mega cansada, meu pé tá cheio de bolha…” Pareço uma mal agradecida reclamona, afinal, segundo o consenso geral, nós temos um “dream job”. Mas as pessoas se esquecem que aquilo, acima de tudo, é um trabalho. Que você não está vendo um museu porque VOCÊ QUER, mas porque, de repente, rende um box bacana ou um abre diferente… Não é que seja ruim viajar a trabalho (ainda mais um trabalho como o nosso!), só é diferente. E se não for assim, diferente, sem dúvida, você, talvez, não volte com uma boa matéria. Beijos!
Mari,estendemos completamente o que vc diz!
Ficamos aqui em nossa volta ao mundo, anotando tudo, horários e preços dos atrativos. Endereços, site e preço, dos restaurantes que gostamos… Super comprometidos em passar todas informações do que estamos vivendo e que poderá ajudar outros viajantes. Gostamos muito de tudo isso, nos dá prazer, mas tudo isso as vezes se torna cansativo.
Nós que não ganhamos para isso, não fazemos por trabalho, podemos fazer ou não fazer, parar qdo quisermos, conseguimos imaginar vc que faz por trabalho!!E que realmente tem um compromissos! Não deve ser facil mesmo não!
Um grande beijo e boa viagem!
Ellen & Antonio
http://www.viagemafora.blogspot.com
Oi Mari,
Adorei seu desabafo. Para qualquer profissão tem que gostar muito. Sempre tem o lado bom e ruim da coisa. Eu reclamo de só ter 30 dias de férias por ano e canso demais nas férias. Fico sempre em hotel fuleiro e morro de saudade da minha cama! Agora voltei do BlogTur e já emendei uma viagem a trabalho ao Rio, de última hora. O Hotel era ótimo, mas acordei pensando onde estou, o que tenho que fazer, que dia da semana é?! Sempre falta tempo para fazer as unhas, lavar roupa, etc. Só imagino a sua “falta de rotina”. É uma decisão difícil mesmo. Eu ainda preciso do meu salário certinho no final do mês. Mas a viajosfera está mudando a minha cabeça. Ou melhor, abrindo! E você é uma das “culpadas” disse! Como disse a Tati, dream maker total! Bjosss
Meu, vc traduziu perfeitamente a vida de jornalista frila de turismo…Vivo o mesmo q vc, a única diferença é que resolvi me mudar para o meio do caminho, assim fica menos cansativo…
Parabéns!
A grama do vizinho é sempre mais verde, certo? A verdade é que só quem viaja muito tem noção da rotina, perrengues e quetalz da coisa. Por isso precisa ter – e você tem! – o ingrediente principal: gostar do que faz. Isso compensa quase tudo.
Mas foi muito bom você desmistificar a profissão para os incautos.